domingo, 22 de novembro de 2009

5.1-Barroca- Surgimento da ópera alemã-Schutz-Gottlieb-Theile-Steffani




Até aqui, estamos falando da Itália, mas não somente este país que vai promover esta revolução musical.





A Alemanha é um outro país a se sobressair neste estilo de música , que é a ópera no seu período barroco. Todas as cortes tinham a sua companhia de ópera, embora fosse dentro do modelo italiano e até o canto era em italiano.

Quem vem fazer uma ópera em alemão, oficialmente pela primeira vez, e conhcida pelos outros países europeus é o fantástico Mozart, porque até então se dizia que a língua alemã era “dura” demais para cantar árias de amor e outros temas, o que não é verdade.

O início da ópera na Alemanha ocorreu de modo diferente da Itália e França. Não foi o resultado da evolução de um gênero, como na Itália, nem teve um desenvolvimento unificado e centralizado, como na França. Foi sim um processo diferenciado que ocorreu em função da estrutura política fragmentada que havia no território germânico e também pela presença de grandes diferenças culturais entre os territórios, cortes e regiões.

Desde muito cedo a ópera despertou grande interesse nas cidades e cortes germânicas do sul (região contra-reformada), especialmente na Áustria, onde o arcebispo de Salzburgo, Marcus Sitticus von Hohenems havia contratado o italiano Francesco Rasi, em 1612, para apresentar uma ópera em Salzburgo.

Realmente isto aconteceu em 27 de janeiro de 1614, num palco especialmente construído para este fim, onde uma ópera italiana foi apresentada pouco tempo após o surgimento do 'dramma per musica' em Florença e depois, logo no mês seguinte, uma versão de Orfeo, que acredita-se que tenha sido a de Monteverdi, devido à presença de Rasi na corte.

Era comum, na época, a apresentação das trupes em cenários ao ar livre, porque não tinham nenhum teatro, diferente da Itália, onde surgiram vários.


A ópera depois foi em direção ao centro e ao norte da Alemanha, passando por Viena, Praga, Torgau e nas regiões contra-reformadas. Mas, enquanto em Viena predominavam as óperas italianas, cantadas em italiano, algumas cortes do norte se esforçaram para apresentar óperas em alemão, que geralmente eram simplesmente traduzidas para o alemão. Essa difusão da ópera, entretanto, foi interrompida pela Guerra dos Trinta Anos (1618-1648).

Ao redor de 1675, com o término da guerra, iniciou um movimento em várias cortes e cidades comercialmente importantes, um movimento em direção à criação de óperas em alemão, sem que contudo houvesse um projeto político para isso ou mesmo um grande centro produtor e difusor de óperas (como o eram Paris e Londres). O que se viu acontecer, foram as várias cidades e cortes cultivarem a ópera de forma mais ou menos autônoma, sendo que as cortes do norte e as do centro, por estarem mais distantes do poder imperial (Austria), e por conseguinte da influência italiana, puderam ser mais criativas e indenpendentes na construção de uma ópera.

Foi ao norte da Alemanha, na cidade de Hamburgo e nas cortes de Braunschweig-Wolfenbüttel e Hannover que a ópera teve melhores condições de desenvolvimento autônomo e independente. As duas alas dessas cortes mostraram-se receptivas ao novo gênero, principalmente por sua orientação pelas óperas francesas e pela presença de Agostino Steffani (1654-1728) como compositor e diplomata em Hannover.


Assim, vários modelos de ópera de diferentes períodos chegaram à Alemanha na metade do século XVII, não mais tão dependentes do modelo original criado em Florença ao final do século XVI, do recitar cantando. Apresentavam-se com mais momentos cantados, elaborados extensos, como a ópera Il Paride, de Giovanni Bontempi (1624-1705), estreada em 1662, em Dresden e da escola romana de Domenico Mazzocchi (1592-1665).

Ao contrário do que ocorreu na França, os territórios germânicos não conheceram o balé como espetáculo autônomo, que foi um dos elementos que contribuíram para o estabelecimento do padrão francês de ópera. Todavia os balés franceses foram incorporados à ópera alemã, tornando-se parte importante do espetáculo, e tão importante que a maior parte dos teatros contratava 'Balletmeister' franceses para criar coreografias e treinar os bailarinos.

A presença de atores ingleses em terras germânicas no começo do século XVII (especialmente no norte), com suas farsas cantadas com canções populares, além das apresentações de peças de Shakespeare e de dramas elisabetanos, também concorreu para a criação da ópera na Alemanha. As sociedades literárias da época, espécie de cameratas, como as sociedades italianas dos séculos XVI e XVII, tinham por objetivo estruturar a língua alemã, e estimular a produção literária neste idioma.



Este talvez fosse o objetivo mais importante destas sociedades, que, a partir dos modelos estrangeiros (especialmente da poesia italiana), procuraram definir formas e procedimentos para a poesia alemã, incluindo aí a normatização da métrica e da rima. Em Hamburgo existiram duas das mais importantes academias alemãs da época, que se revelaram de importância crucial para o desenvolvimento da ópera na cidade.

As condições que proporcionaram o surgimento da ópera na Alemanha fazem com que seja difícil definir o que tenha sido a ópera alemã em seu princípio, porque uma ópera genuinamente alemã seria aquela composta por alemães, com tema e libreto originais em alemão, para uma platéia alemã, cantada em alemão, com músicos e cantores alemães, de acordo com o estilo musical vigente na Alemanha, assim como havia ocorrido em maior ou menor grau na Itália e na França.

A adoção do francês como língua culta em muitas das cortes, no desejo de imitação do modelo de Versalhes, que representava a glória e o esplendor de uma nação unificada, no comportamento germânico manifestou-se de modo semelhante em outras cortes européias. Porém, ao contrário da ópera francesa, cuja existência estava ligada única e exclusivamente ao rei, a ópera alemã também seguiu o caminho burguês da ópera veneziana, orientada para o público pagante.



Diferentemente da ópera francesa, que buscou a criação de um gênero universalmente aceito, difusor e representante do poder absoluto de Luís XIV, a ópera na Alemanha, principalmente a
burguesa, trilhou o caminho da originalidade, da inovação e da renovação permanentes. De modo geral, a incipiente ópera alemã baseou-se no modelo florentino de 'dramma per musica', em cinco atos, mas rapidamente incorporou influências venezianas, resultando na estrutura “abertura-seguida-de-três-atos”.

Aliás, a ópera de Hamburgo foi especialmente influenciada pelo gênero veneziano, além das duas cidades terem situações semelhantes, pois pelo fato da cidade de Veneza ( assim como Hamburgo) ser um porto, uma cidade cosmopolita e um importante pólo comercial. O material musical da ópera alemã era constituído basicamente por canções silábicas, em geral estróficas, de origem popular, e também por Lieder (canções) solo.


Mas com o passar do tempo, rapidamente este aspecto foi sendo modificado: os libretos eram escritos diretamente em alemão e, apesar de manterem a mitologia greco-romana como fonte importante, os temas das óperas passaram a ser extraídos também da história e mitologia alemães ou da Bíblia, ao contrário do modelo estabelecido na ópera italiana, cujos temas eram, nesta época, em sua maioria mitológicos.


A influência francesa manifestou-se especialmente através da inclusão de danças ou movimentos de dança durante os atos e no final das óperas e a importância dada ao coro e ao trabalho musical mais elaborado na música instrumental como em sinfonias, balés e divertimentos.

Entre os fatos mais importantes que marcaram a fase inicial da ópera alemã estão a criação de Seelewig, em 1644, e a presença do compositor italiano Agostino Steffani na Alemanha principalmente na corte Hannover.


Entretanto, em Roma havia algumas reclamações sobre o "recitativo seco" e a ênfase na parte literária. Então, a nova forma de arte, a ópera, foi enriquecida pela música com árias e coros e particularmente com elementos emprestados do drama do Renascimento, cenas religiosas e seculares presentes, vários shows, desfiles e procissões de sucesso ( trionfi ), eventos alegóricos ou bíblicos, interlúdios e comédias de commedia dell'arte.

O anseio por novidades foi estendido para a ópera, com os excessos barrocos de cenário e adereços. Os costumes piedosos foram secularizados, os rituais litúrgicos foram refletidos nas cenas de inúmeros templos e com sacerdotes, procissões religiosas em desfiles, e coros. A ópera formada assim num país católico, onde a liturgia é impregnada com teatralidade, a mistura cerimonial com a paisagem logo ganhou adeptos pela possibilidades de alegorias e cantos.



A difusão mais rápida ocorreu na vizinha França e nos católicos da Áustria. A ópera alcançou as áreas de língua alemã através de Viena, Salzburg e Praga. O norte protestante expressaram reservas a estas influências italianas e católicas, tornando suas composições mais independentes e florescendo com um arranjo mais próprio de construir seus temas musicais.




Alguns estudiodos assinalam que a primeira ópera alemã foi encenada em 1627 no Castelo de Hartenfels perto de Torgau, com a peça chamada de Daphne, com versos do poeta lírico Martin Opitz e música de Heinrich Schütz (1585- 1672), o mais proeminente compositor barroco alemão antes de Bach e Händel. O libreto foi preservado, mas a partitura foi perdida, como outras óperas de Schütz. Portanto, a ópera Dafne de Heinrich Schültz ninguém sabe se poderia ser considerada uma ópera alemã, pois embora fosse inteiramente original e cantada em alemão por músico alemão, sua partitura foi perdida, ficando assim sem saber a sua autenticidade.

Esta ópera foi escrita na ocasião do casamento de Sophie Eleonora da Saxônia com Georg II. E parece que a pedido do pai da noiva foi providenciada uma cópia do libreto de Dafne de Peri e daí uma tradução para o alemão. Portanto, é descartada como a primeira ópera alemã.

Em 1638, novamente com a música de Schultz, foi feita “Orpheus und Euridice", que era uma opera-balé em cinco atos (igualmente perdida), com música de Schütz sobre uma tradução feita por Optiz a partir do libreto de mesmo nome de Rinuccini. Acontece que Schultz conheceu Monteverdi e ficou muito entusiasmado com o seu trabalho, conforme o registro de uma carta sua, dizendo ter vontade de realizar trabalho semelhante na Alemanha. Assim, é provável que seja uma nova adaptação à lingua alemã.



Entretanto, apesar destas e de outras tentativas, foi apenas em 1644 que estreou em Nuremberg a obra intitulada Seelewig, ou "Das geistliche Waldgedicht oder Freudenspiel Genant Seelewig" ( O poema da Floresta Sagrada) que é uma ópera com um prólogo, três atos e um epílogo escrita pelo compositor alemão Sigmund Theophil [Gottlieb] Staden e libreto de Georg Philipp Harsdörffer (1607-1658), publicado pela primeira vez em 1644, tendo sido baseada no "L'anima felice favola boschareccia", na tradução do italiano Nicolò Negri (1606).

Esta obra foi considerada a primeira ópera com características diferentes do modelo italiano, como o uso do idioma alemão e das canções estróficas (de uso corrente e extremamente populares na Alemanha), aplicando os gêneros poéticos da poesia alemã e o fato de a obra ser totalmente cantada, sem os recitativos à italiana. Seguiram-se outras óperas, entre elas, Armelinde (“Singe-spiel”, 1657), com libreto do Duque de Braunschweig.



Na verdade, é a primeira ópera alemã cuja música tem sobrevivido através dos tempos. A ópera mistura números musicais e diálogo falado de uma forma que prefigura uma Singspiel (é uma forma de drama musical em alemão, tida como um subgênero da ópera).

Esta ópera (apenas um trecho) tem que ser mostrada pelo seu valor histórico:









A ela seguiram-se outras, inclusive Adam und Eva, cujo libreto parece ser de Christian Richter e a música de Johann Theile (1646 – 1724), que inaugurou o “Teatro de Gansos de Hamburgo”, de maior importância para a história da ópera (Ópera do Gänsemarkt).





A ópera na Alemanha, então, somente em 1678, quando abriu a primeira casa de ópera em solo alemão, que tomou seus rumos mais consistentes, com o Theater am Gänsemarkt (Market Theatre de Geese) na Cidade Livre Hanseática de Hamburgo, evidentemente como uma concessão privada. A ópera, já em mãos privadas ou de cortesãos, logo fez a descoberta fundamental de que ópera é um entretenimento caro que está sempre oscilando na corda bamba da falência.





Os temas inicialmete das óperas de Hamburgo eram religiosos, devido a severa censura das autoridades religiosas gemânicas. Assim ou eram tomadas da mitologia ou da história antiga. Entretanto, o elemento presente, desde o início, era o que se chamou de "queixa social”, uma alusão à penúria dos camponeses em consequência da Guerra dos Trinta Anos.


Há de se salientar a importância de Agostino Steffani (1654-1728 ) para o desenvolvimento da ópera na Alemanha, que reside no fato de que ele utilizou libretos cujos temas eram extraídos da história germânica, como : Alarico in Baltha (1687) e Henrico Leone (1689). Usava-se o binômio recitativo-ária, com poucos duetos, dando maior refinamento ao canto.

Naturalmente também foram utilizados temas mitológicos, mas a escolha de temas germânicos indica um passo importante em direção à criação da ópera com raízes alemãs.

Fundado em 12 de janeiro de 1678, o Theater am Gänsemarkt foi o primeiro teatro público de ópera da Europa, fora o de Veneza, e gerou uma fusão interessante da aristocracia com a burguesia. Entre o público freqüentador do teatro estavam não somente nobres, políticos, diplomatas e ricos comerciantes, mas também confeiteiros, cervejeiros, ourives, livreiros, cocheiros e aprendizes, entre outros, e para cada categoria havia um lugar determinado no teatro.

A distribuição dos lugares era rígida, conforme a profissão e classe social do público, e é uma mostra da estratificação da sociedade da época. Entre as principais características copiadas do sistema veneziano realça-se o sistema de empreendimento autônomo, encabeçado por um administrador e a entrada do público mediante pagamento.

O modelo adotado pela recém-criada Ópera de Hamburgo foi o da ópera italiana, mas não àquele criado em Florença e já em desuso, nem os oratórios (óperas religiosas) e sim, o modelo veneziano e burguês. Aparecem os ideais da corte misturados a temas populares, a influência de commedia dell´arte (com a presença de um personagem cômico, geralmente um criado do personagem principal), um “aburguesamento” dos ideais aristocráticos e um maior realismo no tratamento dos problemas amorosos.


No caso dos personagens cômicos, de caráter popular, a influência não é apenas italiana, mas tambem reflete igualmente os personagens que faziam tanto sucesso nas trupes de comediantes ingleses, holandeses e alemães nos tipos populares de imenso apelo, principalmente estes por se expressarem no dialeto da região, o Plattdeutsch. Além disso, seu humor baixo, freqüentemente vulgar, agradava pelo grande contraste que faziam com os personagens aristocratas e letrados.


A partir do padrão em cinco atos da ópera que inaugurou o teatro com a ópera Adam und Eva, os compositores de Hamburgo desenvolveram uma intrincada arquitetura musical, cuja estrutura era definida pela disposição de recitativos e árias, somados a balés, coros e música instrumental incidental, que possuíam entre si relações temático-motívicas e tonais.


Os temas das óperas de Hamburgo eram inicialmente religiosos, por causa da severa censura das autoridades religiosas da cidade, ou eram tomados da mitologia e da história antiga. No caso das primeiras óperas, de temática bíblica, estas nada mais eram do que os antigos dramas religiosos medievais adaptados ao novo gênero. Eventualmente eram escolhidos temas da história.


Também contribuíram para a escolha da temática bíblica a grande tradição e popularidade das peças de Natal e daí surgirem muitos oratórios, entre 1660 e 1674. Embora não fosse uma corte, Hamburgo abrigou alguns habitantes nobres e ilustres, entre eles a rainha Cristina da Suécia e o Duque de SchleswigHollstein, que vivia exilado na cidade.

A ópera de Hamburgo revelou-se um modelo bem sucedido de ópera burguesa que não encontrou similares na história alemã, pois parece ter seguido um caminho orientado pela procura de expressão original, desvinculada do sentido de nação, no qual foram acolhidas todas as influências culturais existentes na época.


Entre os pioneiros da ópera alemã estavam os primeiros compositores do teatro de ópera de Hamburgo: Johann Theile, Nikolaus A. Strungk e Johann Franck (1644-1710). Os compositores que se dedicavam à ópera, na época, eram em sua maioria italianos e escreviam no estilo vigente e conhecido, sem promover inovações ou trazer novo impulso ao desenvolvimento do gênero em território germânico. O único italiano a contribuir significativamente para a transição da ópera do século XVII para o XVIII foi Steffani, contemporâneo de Arcangelo Corelli (1653-1713), Johann Pachelbel (1653-1706), Henry Purcell (1659-1695) e Alessandro Scarlatti (1660-1725).



E assim concluindo, a ópera de Hamburgo foi um movimento decisivo para o surgimento de uma ópera genuinamente germânica, começando por não ser um teatro da corte, mas o primeiro teatro público de ópera na Alemanha, fundada pelos cidadãos de Hamburgo, em seguida, pelos prósperos membros da Liga Hanseática, que pôde resistir à dominação do estilo italiano, e logo se tornou o principal centro musical do barroco alemão.

Quando abriu suas portas para apresentar a "Opern-Theatrum" uma música baseada na Escritura por Johann Theile ou quando Häendel estreou sua ópera "Nero" em 1705, cuja pontuação foi perdida para a história ou em 1721 quando Georg Philipp Telemann, figura central do barroco alemão juntou-se à Ópera de Hamburgo, e nos anos seguintes Christoph Willibald Gluck , Johann Hasse Adolph e várias empresas italianas se apresentaram como artistas convidados, só vem confirmar a importâcia que teve na época e no passar dos séculos o teatro de Hamburgo.


Hoje o antigo teatro é o famoso Ópera Estatal de Hamburgo (Hamburgische Staatsoper ), com uma historia de 400 anos, constituindo-se uma das empresas líderes em ópera na Alemanha, com instalações para 2800 espectadores, com um edifício moderno, na área central da cidade de Hamburgo, ostentando a imponência de um dos maiores centros mundiais da música.




A ópera de Hamburgo, a qual muitos consideravam-na infrutífera para a ópera alemã, pertence a uma fase de embasamento para as mudanças que viriam ocorrer nos próximos séculos.




Levic

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